Um dia após a divulgação da Medida Provisória (MP) 688, as geradoras divergiram nas suas análises em relação à proposta apresentada pelo governo. Enquanto Cesp e Cemig alegaram falta de detalhes sobre o acordo, a CPFL Energia divulgou nota pública elogiando a medida.
No mercado, após uma reação inicial positiva, os investidores começaram a calcular o impacto líquido da proposta e as ações de geradoras encerraram o pregão em forte queda. Os papéis da Cemig caíram 4,62%, enquanto os da Copel e da AES Tietê recuaram 3,33%. Para a Cesp, a queda foi de 1,12%
Se, num primeiro momento, foi considerado positivo o fato de o governo reconhecer e se dispor a compensar os custos incorridos desde o começo deste ano - o pior da série histórica -, a questão agora é como se dará essa compensação e qual o peso das contrapartidas exigidas para travar o risco incorrido com a energia gerada abaixo do previsto nos contratos, que antes era ilimitado.
"O governo não está (corretamente) dando um almoço grátis às geradoras", afirma o BTG Pactual em relatório. O banco ressalta que as geradoras que aceitarem a proposta terão que pagar um "prêmio de risco", espécie de seguro, para a conta de bandeiras tarifárias, e contratar energia de reserva - de fonte solar, eólica ou térmica de baixo custo - para fazer um "colchão" para tempos de seca.
Os agentes esperam agora uma nota técnica da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para começar a fazer as contas. O que é certo é que, para cada geradora, haverá um cálculo específico após o período de audiência pública sobre a medida, que vai durar 20 dias, e só a partir dele é que será possível avaliar os prós e contras. O governo quer um acordo em até 30 dias, portanto o tempo é curto.
Um empresário do setor, que preferiu não se identificar, disse que os números terão que ser analisados com calma, principalmente após os desencontros entre regulador e agentes no caso das indenizações provocadas pela MP 579, que tratou da renovação de concessões.
O diretor de relações institucionais da Cemig, Luiz Fernando Rolla, disse que a empresa ainda aguarda detalhes para se posicionar sobre a medida, mas afirmou que já se trata de um "avanço". "A gente já considera o que foi divulgado um avanço, que são condições novas, mas que teremos que nos debruçar sobre elas para avaliar o impacto", afirmou em entrevista.
Em teleconferência realizada ontem, a direção da Cesp se mostrou cética. "Há muitas coisas que não estão claras e em pontos que são muito relevantes. Vamos esperar a nota técnica da Aneel para ter uma avaliação melhor", disse o presidente da Cesp, Mauro Arce.
Um "buraco" na medida já ficou evidente. O governo afirma que a compensação pelos custos incorridos com o risco hidrológico em 2015 será feita via uma extensão no prazo de concessão, mas não afirma o que será feito com as usinas cujas concessões já venceram - caso de 21 hidrelétricas, só neste ano.
A Cesp reconheceu que não sabe o tratamento que será dado a Jupiá e Ilha Solteira, cujas concessões venceram em julho. Segundo Arce, a empresa fará a proposta de compensação dessas duas usinas via a extensão da licença de Porto Primavera, que vale até 2028.
Outra questão é o que será considerado como reembolso. A Cesp, uma das empresas que mais ganhou com a venda de energia descontratada no mercado de curto prazo, alega que deixou de auferir R$ 1 bilhão em "receita potencial" no primeiro semestre, em virtude das restrições impostas pelo Operador Nacional do Sistema (ONS), e quer que isso entre na conta.
Já a CPFL Energia elogiou a medida. Em nota, o presidente do grupo, Wilson Ferreira Junior, afirmou que, em análise preliminar, considera que a proposta tem "uma série de vantagens", na medida em que não onera os consumidores e restabelece a capacidade de investimento das geradoras.
Pela proposta, o risco não será zerado, como se imaginava, mas apenas "travado". O ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, sinalizou que o déficit hídrico máximo a ser suportado pelas geradoras será de 12% a partir de 2016. Acima disso, o montante vai para as contas de luz.
Dos 12%, 7% seriam cobertos por elas por uma espécie de seguro, o "prêmio de risco", a ser aportado na conta de bandeiras tarifárias, com base no preço médio do mercado de curto prazo - o pagamento ocorreria mediante uma redução proporcional nos preços cobrados das distribuidoras. Os 5% restantes seriam suportados via compra de energia de reserva, de fonte eólica, solar ou térmica.
Especialistas apontam que o risco contemplado na proposta é maior que os 5% que os geradores vinham conseguido nas liminares judiciais, das quais precisam abrir mão para aderir ao novo mecanismo, o que pode ser um entrave. (Colaborou Marcos de Moura e Souza, de Belo Horizonte)
20/08/2015 - Fonte: Valor Online